Entrevista com Dr. Lívio Dias traz muitas informações sobre aos desafios encontrados no seu dia a dia. Dr Lívio atua como infectologista em duas UTI Neonatais e também pertence à vigilância sanitária na área de serviços.
Graduado em medicina pela Universidade Federal de Goiás Residência Médica em Infectologia pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas MBA em Gestão e Controle de infecção Médico do Controle de Infecção Hospitalar da Maternidade Pro Matre Paulista e Hospital Santa Joana Médico da Divisão de Serviços de Saúde Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo Membro do Comitê Estadual de Infecção Hospitalar do Estado de São Paulo.Liliana – Quais os maiores desafios no controle de infecções na neonatologia?
Dr. Lívio: Os desafios são diversos no controle de infecção em neonatologia. Para começar, predominam nas UTI neonatais os prematuros, pacientes que são imunodeprimidos, inaptos em diversos órgãos e sistemas em que por vezes nem a barreira cutânea está adequadamente presente. Quanto maior a prematuridade maior a necessidade de procedimentos invasivos, como cateteres, tubos e sondas, funcionando com risco para a aquisição de infecções. Além disso, as infecções no período neonatal carreiam o potencial de grande morbidade, já que esses recém-nascidos (RN) se encontram em franco processo de desenvolvimento e uma simples infecção pode comprometer especialmente o prognóstico neuropsicomotor dessas crianças. Somem-se a todos esses riscos as grandes expectativas de pais, afinal são seus filhos ali internados e não faz parte da expectativa natural dessas famílias que se dirigem a maternidade enfrentarem esse tipo de provação.
Liliana – Os microrganismos são muito diferentes daqueles encontrados nas UTI adultas?
Dr. Lívio: Sim, regra geral, nos ambientes de UTI neonatais com um bom controle de infecção, predominam alguns agentes infecciosos bacterianos com perfis mais favoráveis de susceptibilidades aos antimicrobianos, quando comparados aos agentes de UTI adulto. Bactérias com pouca probabilidade de causar infecções em adultos, com colonizantes de pele, podem ser os principais causadores de infecção em recém-nascidos
Além disso, costumam predominar os gram-positivos sobre os gram-negativos especialmente na sepse neonatal tardia. Microorganismos da microbiota materna como o Estreptococcus do grupo B e a Escherichia coli são os mais prevalentes nas sepses precoces. Vírus como o vírus sincicial respiratório e o citomegalovírus, relativamente incomuns nas UTI adulto, podem ser especialmente prevalentes nas UTI neonatais.
Liliana – Quantos leitos tem a UTI Neonatal onde você atua?
Dr. Lívio: Na UTI onde atuo são 67 leitos de UTI neonatal para um volume de aproximadamente 1000 partos por mês. Por volta de 11-13% dos nascidos vivos necessitarão de cuidados intensivos ou semi-intensivos.
Liliana – Qual a média de peso dos bebês ?
Dr. Lívio:A média de peso normalmente não é um indicador que obtemos, mas no geral, aqueles com peso de nascimento < 2.500g e/ou com Idade Gestacional <34 semanas, terão maior necessidade de cuidados em UTI neonatal, além, é claro, de inúmeras outras condições como malformações congênitas, infecções, defeitos metabólicos, doenças maternas, e etc. Os RN com peso de nascimento extremamente baixo com <500g, ainda que eventuais, têm se tornado mais freqüente com os avanços da medicina no cuidado materno e neonatal.
Liliana – Qual o papel dos pais no controle de infecção?
Dr. Lívio: Os pais são fundamentais no controle de infecção no ambiente de UTI neonatal, especialmente quando levamos em consideração que esses RN não podem se expressar verbalmente. Percepções sutis como discretas reduções na atividade habitual do recém-nascido podem indicar quadros infecciosos e os pais podem ser os primeiros a alertar o neonatologista. Além disso, o contato próximo dos pais permite que esses RN se colonizem com uma microbiota mais “fisiológica” do que aquela usualmente encontrada dentro do ambiente hospitalar. Estratégias como o método “Mãe Canguru” que propiciam o contato do RN pele a pele com os pais por algumas horas por dia têm demonstrado o seu efeito na humanização do cuidado e redução do tempo de internação e necessidade de cuidados intensivos.
Liliana –É muito comum no seu hospital uma mãe ou pai tomar conta/ pegar no colo o bebê do lado e com isso comprometer o controle de infecção?
Dr. Lívio: Não, como já dito anteriormente, o contato com os pais e fundamental e extremamente incentivado nas UTIs neonatais. No entanto, para que tudo ocorra de maneira segura para os RN, os pais devem ser orientados sobre algumas práticas como: a correta higiene de mãos, não adentrar a UTI em caso de suspeita de doença infecciosa (resfriados, diarréias, conjuntivite, etc), retirar adornos, evitar o uso do celular dentro da unidade.
Liliana – Sabemos que um dos maiores desafios em controle de infecção é a lavagem de mãos. Você como infectologista conflita muito com os profissionais deste setor? Quem dá mais trabalho?
Dr. Lívio: Sem dúvida higiene de mãos acaba sendo sempre um desafio em qualquer serviço de saúde. No entanto, com múltiplas estratégias de sensibilização a essa boa prática ótimos resultados podem ser obtidos. Cito aqui somente duas dessas estratégias de sucesso adotadas dentro da instituição onde trabalho. A primeira foi a criação de um grupo de higiene de mãos formados pelos profissionais da própria assistência e teve um impacto tremendo na adesão a essa prática já que os mesmos, por atuarem diretamente na assistência, conseguem disseminar a cultura da importância de higiene das mãos com maior facilidade entre os demais colaboradores. Outra estratégia são as campanhas semestrais de higiene de mãos, sempre com temas diversos e abordagem lúdica, conseguem motivar os profissionais dos mais diversos setores.
Liliana – Quais as recomendações que você daria para os pais ao visitar os bebês na UTI Neonatal ?
Dr. Lívio: Higienizar as mãos utilizando a técnica correta ao adentrar a unidade e nos demais 5 momentos preconizados pela Organização Mundial de Saúde. Além disso, notificar a equipe assistencial sempre quando apresentar qualquer sintoma de doença infecciosa ou mesmo na ausência de sintomas, mas com história de contato. Ainda, evitar o uso de aparelhos eletrônicos dentro do ambiente de UTI neonatal, especialmente celulares e máquinas fotográficas.
Liliana – Quais as recomendações que você daria para os pais ao levar os bebês de baixo peso que acabaram de sair da UTI Neonatal para casa?
Dr. Lívio: Conferir e atentar para o esquema de vacinação desses RN, que podem ser diferentes daqueles nascidos a termo. Na ocorrência de algum quadro infeccioso após a alta, preferencialmente retornar ao serviço de saúde de origem ou pelo menos comunicar este serviço imediatamente, já que as condições de alta do RN podem dar pistas fundamentais para um diagnóstico precoce e tratamento efetivo.
Agradecemos Dr Lívio pelo brilhante depoimento e desejamos muito sucesso na sua luta diária para restabelecer os pequeninos!
Receba o nosso abraço!
Liliana Junqueira de P. Donatelli