O que você deve saber sobre necrose no maxilar associada ao uso de medicamentos contra osteoporose para prática segura da implantodontia clínica
A implantodontia é uma especialidade que vem crescendo bastante na odontologia e cada vez com mais sucesso. Entretanto existem possibilidades para o insucesso do procedimento. Uma delas é a necrose no maxilar associada ao uso de medicamentos contra osteoporose. Para falar sobre esse assunto convidei o professor Juliano Milanezi de Almeida, PhD1* e o pós-graduando Henrique Rinaldi Matheus, DDS2.
Liliana Junqueira de P.Donatelli
Medicamentos para Osteoporose
Os bisfosfonatos (BPs) são um grupo importante de drogas utilizadas para o tratamento de patologias metabólicas e oncológicas que envolvem o sistema esquelético. Os BPs orais são comumente empregados no tratamento de osteoporose e osteopenias. Já os intravenosos são administrados para pacientes com câncer de mama, metástases ósseas, hipercalcemia e mieloma múltiplo.
Juntamente com o aumento na expectativa de vida da população, há também uma maior incidência nos casos de câncer. Isso implica uma situação na qual a população estará cada vez mais indicada ao uso dessas drogas. As progressivas gerações de BPs e o tipo da droga aumentam muito sua efetividade sobre o tecido ósseo, contudo, aumentam proporcionalmente a incidência dos efeitos colaterais associados.
Como acontece a Osteonecrose?
A osteonecrose dos maxilares (ONM) é, na odontologia, a principal complicação associada ao uso desses fármacos. Apesar da sua etiopatogenia ser bastante controversa, alguns possíveis fatores desencadeadores são: potente supressão da atividade reabsortiva dos osteoclastos, que pode gerar microfaturas e acúmulos de tecido ósseo não vital; favorecimento de infecção por aumento na capacidade de adesão e colonização bacteriana; e efeito citotóxico sobre as células da mucosa bucal, que reduz sua capacidade de reparo.1,2
Risco para Osteonecrose e Implantes
Sendo assim, as manipulações que envolvem tecidos moles e duros na cavidade oral podem exercer uma incisiva influência sobre o desencadeamento da ONM. Com esse pensamento fixado, é inevitável projetar que as intervenções para instalação de implantes osseointegráveis intraósseos sejam um risco para pacientes sob os efeitos desses medicamentos.
O que dizem as evidências científicas ?
Ruggiero et al. (2014)2classificaram a ONM-M (BPs) da seguinte maneira: estágio I: osso necrótico exposto com ausência de dor ou sinais de infecção (assintomático); estágio II: osso necrótico exposto com presença de dor ou sinais de infecção (sintomático); estágio III: osso necrótico exposto com presença de dor e/ou sinais de infecção juntamente com um ou mais dos seguintes sinais: fratura patológica, fístula oro-cutânea, envolvimento do seio maxilar ou extensão da necrose para a borda inferior ou ramo da mandíbula.
Apesar da ampla difusão e preocupação com ONM serem comumente vinculadas a uma série de casos descritos em 2003, por Marx3e Migliorati4, o primeiro estudo referindo aos efeitos dos BPs sobre implantes de titânio é datado de 1995 e atribuído a Starck e Epcker5. Esses autores descreveram o caso de um paciente que recebeu cinco implantes interforaminais, e, após tratamento com etidronato perdeu toda sua reabilitação.
Nos estudos de Marx e Migliorati, a maior incidência de ONM mesmo que não relacionada a implantes, foi atribuída a dosagens intravenosas de BPs, enquanto para administração oral não foi observada significância estatística. Após esses resultados, inúmeros outros estudos se propuseram a avaliar essa correlação, principalmente fundamentados nas deficiências observadas nesses dois estudos.
As controvérsias
A verdade de que dosagens oncológicas intravenosas de BPs são fator de risco para ONM são indiscutíveis e, por isso, os guidelines publicados pela Associação Americana de Cirurgiões Orais e Maxilofaciais afirmam absoluta contraindicação da instalação de implantes de titânio em pacientes tratados nessa modalidade.2 Por outro lado, desde as publicações de Marx e Migliorati se passaram 15 anos, os métodos de pesquisa e análises de resultados evoluíram muito, e, mesmo assim, revisões sistemáticas e meta-análises, que são classificadas como a modalidade de publicação com maior relevância de evidências científicas, apontam incongruidade e inconclusividade entre resultados de estudos clínicos avaliando BPs orais e implantes.
Mesmo essas revisões não sendo capazes de afirmar a possível relação de causa/efeito entre BPs e desencadeamento de ONM em pacientes submetidos a cirurgia para instalação de implantes, elas também não são capazes de afirmar sua ausência.
Alguns pesquisadores propõem que seja cessado o uso da medicação anteriormente à intervenção cirúrgica, contudo, apesar de sua meia vida sanguínea não ser consideravelmente longa, moléculas da droga permanecem nos tecidos corpóreos por anos após a interrupção do tratamento. A simples presença dessas moléculas pode tornar passível de que ocorra ONM em decorrência dos BPs.
As divergências e negligências profissionais no que diz respeito à ONM relacionada ao uso de BPs encorajam e fundamentam diversas pesquisas, inclusive propondo terapias preventivas ao desencadeamento dessa condição. A fotobiomodulação apresentou bons resultados em uma avaliação pré-clínica em alvéolos pós extração, mesmo em animais recebendo zoledronato, que é um potente fármaco intravenoso6. Esse artigo pode ser utilizado para projetar uma maior segurança na reabilitação de pacientes recebendo medicação antirreabsortiva para o tratamento de osteoporose e osteopenias.
Então o que fazer?
Os fatos da literatura ser inconclusiva para contraindicação da instalação de implantes em pacientes sob tratamento com BPs orais, e a proposição de terapias preventivas para ONM estar em fase inicial, fazem com que as reabilitações implantossuportadas devam ser planejadas com cautela e mediante diálogo com o médico responsável pela prescrição.
Os autores
1Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia e Clínica Integrada – Disciplina de Periodontia. Faculdade de Odontologia de Araçatuba – UNESP, Araçatuba, São Paulo, Brasil.
2Pós graduando do Programa de Pós Graduação em Odontologia – Área de Periodontia. Faculdade de Odontologia de Araçatuba – UNESP, Araçatuba, São Paulo, Brasil.
*Autor correspondente
Juliano Milanezi de Almeida Endereço: Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP: Rua Jose Bonifácio 1193, Centro.CEP: 16015-050 Araçatuba, SP, Brasil. Tel/Fax 55- 1836363239E-mail: jumilanezi@hotmail.com
Referências
- Allen MR, Burr DB. 2009. The pathogenesis of bisphosphonate-related osteonecrosis of the jaw: so many hypotheses, so few data. J Oral Maxillofac Surg 2009; 67:61-70.
- Ruggiero SL, Dodson TB: American Association of Oral and Maxillofacial Surgeons position Paper on Medication-Related Osteonecrosis of the Jaws- 2014 Update. J Oral Maxillofac Surg 2014, 72:1938-56.
- Marx RE. Pamidronate (Aredia) and zoledronate (Zometa) induced avascular necrosis of the jaws: a growing epidemic. J Oral Maxillofac Surg2003; 61:1115-17.
- Migliorati CA. Bisphosphanates and oral cavity avascular bone necrosis. J Clin Oncol2003; 21:4253-54.
- Starck WJ and BN Epker. Failure of osseointegrated dental implants after diphosphonate therapy for osteoporosis: a case report. Int J Oral Maxillofac Implants1995; 10: 74-8.
- Statkievicz C, Toro LF, Mello-Neto JM, Sá DP, Casatti CA, Issa JPM et al. Photomodulation multiple sessions as a promising preventive therapy for medication-related osteonecrosis of the jaws after tooth extraction in rats. J Photochem Photobiol B 2018; 184: 7-17.